terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Da impossibilidade da eficiência informacional dos mercados

(On the impossibility of Informationally Efficient Markets)
American Economic Review. Volume 70. No 3. 1980
Sanford Grossman e Joseph Stiglitz

Esse artigo trata da análise teórica sobre a hipótese de mercados eficientes (HME), já tratada aqui. O argumento dos autores é que não é possível que o preço reflita todas as informações a todo o momento havendo custos (privados) de obtenção da informação (privada). Por informação privada entende-se aquela informação que só pode ser obtida com custo, diferente de informação pública (sem custo para se obter) e não necessariamente igual a informações internas (insider information). Sem lucros privados para compensar o custo privado de obtenção de informação, não haveria incentivos para a procura por informações que não serão incorporadas nos preços, dessa forma levando à ineficiência de mercado.

O modelo começa com o retorno do ativo de risco, dado por:
u = Θ + ε

Θ é o componente do retorno do ativo que pode ser antecipado por meio da obtenção de informação ao custo c. ε é o erro aleatório associado ao Θ. Investidores informados são aqueles que tomam decisões baseados em Θ e no preço do ativo. Investidores desinformados só conseguem observar o preço do ativo. A questão da eficiência de mercado passa por saber o quanto da informação é incorporada ao preço, o que indicará o quanto da informação privada os investidores desinformados conseguirão observar por meio de observações dos preços.

Investidores informados arcam com o custo de obtenção de informação, mas podem obter retornos superiores pela observação de informações privadas. Investidores desinformados não arcam com o custo de obtenção de informações, estão em desvantagem em relação aos investidores informados, mas essa desvantagem não é completa já que podem se beneficiar de parte da obtenção de informações por meio da transmissão destas para os preços dos ativos. Um equilíbrio é definido quanto a utilidade esperada dos dois tipos de investidores for a mesma. A função utilidade é definida como avessa a risco e aversão absoluta constante a risco (conforme o patrimônio cresce, aplica-se a mesma quantidade em ativos de risco).

Duas variáveis são importantes no modelo construído pelos autores. A primeira é a variância do erro aleatório associado ao Θ (σε), que indica a precisão das informações obtidas pelos investidores informados. Quanto menor for essa variância, mais informativo será o sistema de preços. A segunda é o ruído. O sistema de preços revela aos investidores desinformados uma parte das informações obtidas pelos investidores informados. Essa relação é dada pela seguinte equação:

wλ = σε – (α.(σε^2)/ λ)*(x-Ex*)
(ver siglas abaixo)

(α.(σε^2)/ λ)*(x-Ex*) é o ruído da informação. Logo, os investidores desinformados podem observar Θ menos o ruído.

Existe um equilíbrio com a porcentagem de investidores informados estando acima de 0% e abaixo de 100%. Esse equilíbrio tem como características:

• Quanto mais investidores informados existir, mais informativos serão os preços (menor σε)
• A razão da utilidade dos investidores informados e desinformados decresce com o aumento de investidores informados
• Existirão mais investidores informados com menores custos de informação
• Conforme a qualidade das informações aumenta, a demanda por informação aumenta, o número de investidores informados aumenta e (pelo primeiro ponto) os preços serão mais informativos.
• Quanto mais ruído houver, menos informativo será o sistema de preços, aumentando o retorno por conta da informação e a quantidade de investidores informados

Pelas relações acima, o equilíbrio se dá com as seguintes relações:

• Menos ruído → Mais informativo será o sistema → Menos investidores informados
• Maior precisão na informação→ Mais informativo será o sistema → Menos investidores informados
• Menos investidores informados → Menos informativo será o sistema→ Mais investidores informados

Essas relações operam até que a porcentagem de investidores informados seja tal que nenhum investidor informado deseje se tornar desinformado ou vice-versa.

A divergência com a HME começa com o estabelecimento de ruído igual a zero e/ou precisão da informação igual a 100% (ou variância do erro nula), hipóteses compatível com a HME. Nessa situação, o equilíbrio seria que nenhum investidor será informado. Se toda a informação (privada) obtida a um custo (privado) é transmitida para os preços, então não há incentivos para a obtenção de informações. Isso levaria a nenhum investidor ser informado. Porém, se nenhum investidor for informado, então ninguém se beneficia com a informação. Isso leva ao desejo de se tornar informado. Porém, se toda a informação for transmitida aos preços, então não há incentivo para a obtenção de informação. Nessas condições (ruído nulo e/ou informação totalmente precisa com custo de obtenção de informação), não há como haver um equilíbrio que suponha correta a HME.

Apesar do forte título do artigo, os próprios autores afirmam que não estão tentando destruir a HME, apenas redefini-la. Só que não há uma redefinição presente neste artigo (se tem, não a descobri). Uma definição menos forte já havia sido escrita anteriormente por Jensen (1978): “Um mercado é eficiente no que diz respeito a um conjunto de informações quando é impossível conseguir lucros econômicos ao negociar com base nesse conjunto de informações”. Por lucros econômicos Jensen entende o retorno ajustado ao risco após todos os custos. Fama (1991) posteriormente melhoraria essa mesma definição escrevendo que “preços refletem a informação até o ponto em que o benefício marginal de agir com informação não excede o custo marginal”.

De resto, esse artigo apenas estabelece o paradoxo dos mercados eficientes (expressão utilizada por Peter Bernstein em editorial para o Journal of Portfolio Management). Por conta da HME, os investidores iriam desistindo de tentar bater o mercado, tarefa supostamente infrutífera. Mas, se todos desistissem de tentar conseguir retornos superiores, o mercado deixaria de ser eficiente. Só há essa dificuldade em se obter um retorno anormal em cima do mercado porque há a competição de vários investidores querendo esse mesmo objetivo. Se não há essa competição, não há eficiência de mercado e a eficiência de mercado requer a existência de "céticos" para que exista. E (na minha opinião) os resultados do modelo de Grossman e Stiglitz com ruído zero na transmissão de informações podem ser compatíveis com a HME, desde que os investidores não esperem que inexista o ruído. Talvez tudo o que o modelo nos diz é que não há como haver um consenso de que haja a eficiência de mercado, e não que inexista.

Uma última nota diz respeito a uma implicação desse artigo bastante lisonjeira aos fundos de investimento com gestão ativa (que podem ser entendidos como investidores informados). O modelo de Grossman e Stiglitz estabelece que investidores informados deveriam ter um retorno superior para compensar o custo de se obter informações. Isso gera a hipótese de que investidores informados (fundos de gestão ativa, p.ex.) obtêm retornos superiores, algo a ser analisado empiricamente. Elton et. al. (1993) analisaram essa questão. Ainda vou tratar desse artigo, mas uma das conclusões do artigo é a refutação de que fundos de gestão ativa obtém um retorno por serem informados ou mesmo um retorno por serem mais informados do que outros fundos.

Siglas
Para ajudar a entender o meu resumo e para ajudar os que por acaso se aventurarem a ler o artigo, um resumo das siglas. Ressalve-se que posso ter errado na interpretação de alguma dessas siglas e que nem todas utilizadas no artigo estão ai.

u = Retorno do ativo de risco
θ = Componente aleatório do retorno do ativo associado à posse de informação
e = Componente aleatório de erro da informação
R: Taxa livre de risco
P: Preço do ativo de risco
c: Custo da informação
x: Demanda pelo ativo de risco
λ: Porcentagem de investidores informados
M: Quantidade de ativos sem risco na carteira
X: Quantidade de ativos com risco na carteira
W = Riqueza do investidor
σ^2e = Variância do erro
a: Coeficiente de aversão a risco
wλ: O quanto do retorno devido à informação é revelado aos investidores desinformados
n = Qualidade da informação
1/m: Quantidade de informações incorporadas nos preços

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