domingo, 11 de abril de 2010

Opiniões sobre o objetivo das empresas

Esse texto analisa duas pesquisas de opinião relevantes para o assunto que vinha sendo discutido aqui. A primeira é uma extensa pesquisa que resultou no livro “A cabeça do Brasileiro” de Alberto Carlos Almeida. A segunda é uma pesquisa já antiga da revista Exame.

A pesquisa do livro de Almeida conclui que o brasileiro ama o Estado, inclusive em questões econômicas. Em uma pergunta sobre quais áreas o Estado deveria ter controle, só empresas transporte, de telefonia fixa e móvel e fabricantes de carros não foram consideradas como áreas onde o governo deveria predominar. 71% dos entrevistados acreditam que o governo deveria predominar no setor de saúde, 69% no de educação, 68% em estradas e rodovias, 64% no setor de energia elétrica e 51% nos bancos, para citar os setores com companhias privadas de capital aberto. A única divergência por conta da renda se dá na opinião sobre os bancos, menos da metade dos que ganham acima de R$ 801 por mês tendo a opinião de que o governo deve predominar no setor.

A maioria também concordou que o Estado deveria estabelecer preços dos produtos oferecidos pelas empresas, impondo limites máximos (imagino). Mais da metade das pessoas acredita fortemente que o governo deveria controlar os preços, não só de serviços básicos, mas de todos os produtos. Só faltou perguntar quantas pessoas concordariam que o Governo determinasse um preço máximo para o preço do trabalho delas.

Além disso, há mais concordância do que discordância no que diz respeito às afirmações: “O governo deve dizer tudo o que as empresas têm que fazer”, “só as empresas devem treinar os trabalhadores” e “o governo deveria definir o valor dos salários”.

Por outro lado, a maioria das pessoas considerou que as empresas de todos os portes são eficientes, considerando ineficientes as instituições públicas ou privadas com fins públicos (partidos políticos). A avaliação positiva a respeito da eficiência das grandes empresas soma 69%, das pequenas e médias 83% e da imprensa 80%. Por outro lado, as avaliações positivas do Congresso somam 36%, do Governo Federal 51% e dos partidos políticos 28% (a pior avaliação). Considere-se que isso se trata de opinião e impressões, não de fatos.

Também, as entidades privadas são consideradas mais confiáveis do que as públicas. A única instituição a receber mais de 51% de avaliações positivas a respeito de confiança é a Igreja Católica. Mas as entidades privadas (Imprensa, grandes empresas e pequenas e médias empresas) possuem grau de confiança superior ao Governo Federal, que é mais confiável que o Congresso e os partidos políticos.

Assim, chegamos a um paradoxo (que o autor chamou de esquizofrenia): os brasileiros amam o Estado, mas o consideram ineficiente e pouco confiável. O autor atribuiu essa situação à ideologia popular: as pessoas querem que o Estado cuide delas, que interfira na Economia, independente do Estado ser eficiente ou confiável. Para mim, o paradoxo continua a existir. Não deixa de me surpreender que as pessoas queiram dar mais dinheiro e poder para instituições que consideram ineficientes e pouco confiáveis. É parecido com a situação em que uma pessoa não confia em um mecânico que demora muito para realizar seu serviço, mas que, não obstante, passa com razoável freqüência nesse mecânico e faz tudo que ele sugere.

Que se prefira mais ou menos atuação estatal na economia é uma questão de opinião. O que acho perturbador é que as pessoas queiram mais Governo, apesar de não confiar nos governantes e de acharem que o Governo é ineficiente.

Outra pesquisa interessante sobre assunto semelhante é uma reportagem já antiga (2004) da revista Exame. A pesquisa perguntou qual das missões mencionadas se aplica para as empresas. 93% dos entrevistados consideraram que a missão das empresas deveria ser gerar emprego, 60% “ajudar a desenvolver o país”, 42% “desenvolver trabalhos comunitários”, 31% “aliar crescimento à justiça social” e por aí vai. Dar lucro para os acionistas foi considerado como a missão das empresas apenas para 10%, perdendo até para “sem ferir a ética, derrotar a concorrência”. Não acho que muito tenha mudado nos últimos 6 anos. Em uma pesquisa com empresários, 82% mencionam como missão da empresa dar lucro para os acionistas, sendo essa a alternativa com mais menções.

Essa pesquisa não foi feita, mas imagine que se fizessem perguntas semelhantes às pessoas a respeito da pessoa enquanto trabalhador. Suponho que “gerar bem-estar para a própria pessoa” não seria a missão menos mencionada, “gerar emprego para outras pessoas” não seria a principal e tenho minhas dúvidas se 42% concordariam que a destinação dos salários deveria ser para trabalhos comunitários. Essas suposições se baseiam na hipótese (bastante intuitiva, a se verificar mais rigorosamente) de que as pessoas são extremamente liberais no uso do dinheiro dos outros (ou palpite sobre o uso), mas bastante conservadoras quando se trata do próprio dinheiro.

Pelas porcentagens, fica claro que as pessoas atribuíram mais de uma missão para a empresa (de outra forma, a soma das porcentagens seria 100%). Como argumentado por Jensen, múltiplos objetivos/missões é nenhum objetivo/missão, mesmo ignorando por completo o lucro. Desenvolver trabalhos comunitários e gerar empregos em algum momento entram em conflito. Eu poderia maximizar o lucro da empresa e direcioná-lo para o desenvolvimento de trabalhos comunitários, sobrando apenas 10% para os acionistas. Porém, para maximizar o desenvolvimento de trabalho comunitário com 90% do lucro da empresa, preciso contratar menos pessoas. Se eu contrato mais pessoas, desenvolvo menos trabalho comunitário. Mesmo que tire os 10% que iriam para os acionistas, o conflito persiste.

Resistir é inútil. O charme da idéia de que as empresas não deveriam buscar “meramente o lucro”, mas que deveriam buscar o objetivo de um “amplo público” é irresistível. No entanto, me mantenho na minoria dos 10% que acha que a empresa tem como missão gerar lucro para os acionistas, ou em uma minoria ainda menor trocando “lucro” por “valor” ou ainda na minoria da minoria que acha que esse deveria ser o objetivo único.

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