sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Teoria dos Stakeholders e objetivo das empresas

Teoria das partes interessadas objetivo das empresas

Em texto anterior, analisei as ideia de Milton Friedman sobre responsabilidade social das empresas, com foco no acionista. Max Clarkson escreveria um artigo que colocaria o objetivo da empresa como atender às demandas de partes interessadas.

Este é um artigo bastante diferente do artigo de Friedman, porém em um ponto os dois concordam. Reconhecem que a discussão sobre a responsabilidade social é vaga, mal definida e muito ampla. Os propósitos de cada um, porém, diferem: Friedman retirou qualquer importância dessa questão e Clarkson propõe uma conceituação melhor e coloca essa idéia como central na administração das organizações.

O texto se propõe a: resumir as abordagens sobre o tema; fazer algumas conceituações importantes; tirar algumas conclusões oriundas das pesquisas do autor. A primeira parte, a revisão das abordagens passadas, não será tratada aqui.

Na parte “Discussões das conclusões da pesquisa”, o autor define como questões sociais aquelas que a sociedade considera como tal e age para que as pessoas e as instituições levem-nas em conta através de legislação e regulação. As empresas, então, têm a responsabilidade sobre questões que a sociedade exija, explicitamente, que tenham (isso define a Responsabilidade Social das Empresas). Mas varia o grau com que as empresas respondem a essas questões (“Responsividade” Social). As empresas podem reagir a isso de uma forma reativa, defensiva, acomodativa ou proativa.

Como exemplos, a sociedade considerou relevante tratar da questão da poluição e dos direitos do consumidor e, através de seus representantes (os políticos), instituiu leis e códigos sobre os assuntos. As empresas, a partir desse ponto, possuem responsabilidade sobre esses temas e devem responder a eles da maneira que preferirem. Um exemplo mais concreto (citado pelo texto) é o do Tylenol da Johnson & Johnson, que precisou de um recall e os próprios funcionários agiram rapidamente, antes mesmo de a empresa ser acionada pelos órgãos reguladores. A empresa tem responsabilidade social sobre os seus produtos e reagiu de forma proativa sobre isso.

Porém, as empresas não deveriam ser recompensadas de forma alguma por isso. Seguir as normas e leis vigentes não diferencia o desempenho das empresas. O autor passa então a definir o terceiro conceito importante, Desempenho Social das Empresas, como aquilo que a empresa faz sem que tenha obrigação legal de fazer, em outras palavras, sem que seja uma imposição da sociedade. Mas, sobre quais questões irá a empresa se preocupar, de tantas existentes? Aquelas relacionadas a pessoas e instituições com as quais a empresa interage.

E eis que entra em cena o conceito de stakeholder (partes interessadas, públicos estratégicos, não há uma tradução consensual). O autor define os stakeholders como “pessoas ou grupos que tenham, ou exijam, direitos de propriedade ou interesses na empresa, em suas atividades passadas, presentes ou futuras”.

Há ainda a distinção entre stakeholders primários, sem os quais a empresa não pode sobreviver, e stakeholders secundários, definidos como aqueles que são afetados ou afetam a empresa, mas que não são essenciais. Exemplos de primários são acionistas e investidores (sic), empregado, clientes e fornecedores. Exemplos de secundários são a mídia, as agências de classificação de risco e terroristas (por mais surpreendente que possa parecer). O desempenho social, então, passa por atender de forma satisfatória esses stakeholders, principalmente os primários.

Feitas essas conceituações bastante úteis, o autor passa a fazer uma definição da empresa e do objetivo da empresa.

1 – A empresa é um sistema de stakeholders primários.
2 – O objetivo da empresa é criar e distribuir valor suficiente para cada stakeholder de forma a garantir que cada stakeholder continue a fazer parte do sistema corporativo.
3 – A falha em reter um stakeholder primário irá resultar na falência do sistema corporativo e sua incapacidade em continuar a existir.
4 – A falha em reter a participação de um stakeholder é resultado da incapacidade de criar e distribuir valor suficiente para esse stakeholder ou a distribuição de valor para um em detrimento dos outros.
5 – Sucesso ou fracasso é um processo demorado e é possível antecipar satisfação ou insatisfação dos stakeholders.

E três proposições:

1 – Na falência ou concordata de uma empresa, é possível mostrar que um ou mais stakeholders se retiraram do sistema.
2 – Uma empresa com lucros acima da média da indústria de maneira consistente cria valor a seus stakeholders.
3 – Uma empresa com lucros abaixo da média da indústria de maneira consistente destrói valor de seus stakeholders.

O autor propõe como métrica a “satisfação dos stakeholders” (sem dizer bem do que se trata essa métrica). Uma forma de medir isso é fazer uma pesquisa com representantes de cada grupo sobre os níveis de satisfação com o valor recebido.

A conclusão é uma redefinição do objetivo da empresa (conforme ponto 2 acima das proposições) em substituição dos indicadores dos acionistas como preço das ações, dividendos ou lucro.

Algumas observações:

1 – Tratar o acionista como stakeholder é um erro. É a volta do uso incorreto do termo “empresa” como se fosse algo auto-dirigido, auto-interessado. É também a expropriação conceitual dos acionistas. Stakeholders devem ser considerados tomando como referência as operações da empresa que pertence aos acionistas.

2 – Em certo ponto, o autor fala em “acionistas e investidores”. É, no mínimo, uma redundância. Talvez o autor quisesse tratar por “investidores” os investidores em títulos de renda fixa da empresa, mas as palavras bondholder ou credor seriam infinitamente melhores.

3 – O autor fala em “valor suficiente”. Essa é a maneira inadequada de se tratar dos objetivos das pessoas ou grupos. Um valor suficiente pode ser atingido de inúmeras formas, umas mais outras menos eficientes. O objetivo deve ser algo que diga qual dessas formas é preferível.

4 – A questão apontada por Friedman sobre o problema de agência sequer foi abordada no texto. É dito que o objetivo da empresa (portanto, de seus administradores) é gerar valor para uma miríade de interessados e o principal (acionista) é só mais um desses interessados. Empregados e clientes não são principais dos administradores (são agentes e principais deles mesmos) e fornecedores têm um principal (seus acionistas, assim como clientes corporativos) e deveriam agir para atingir o objetivo deles.

A Stakeholder framework for analyzing and evaluating corporate social performance
Max E. Clarkson (Academy of Management Review, 1995)

Fonte da imagem: Wikipédia

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